Diálogos entre a ética da Grécia antiga e a ética do Monte Sinai: uma complementariedade necessária

“O pensamento
é o ensaio da ação.”
(Sigmund Freud)

RESUMO: Este texto aborda algumas das características mais marcantes da ética desenvolvida na Grécia Clássica, especialmente por Sócrates, Platão e Aristóteles, e da ética comunicada por Moisés, realçando a necessidade de serem estudadas e utilizadas em conjunto, pois cada uma faz contribuições importantes para o desenvolvimento da sociedade.

PALAVRAS-CHAVE: Ética; Filosofia; Grécia; Lei Mosaica.

ABSTRACT: This text addresses some of the most striking features of the ethics developed in Classical Greece, especially by Socrates, Plato and Aristotle, and the ethics communicated by Moses, highlighting the need to be studied and used together, as each makes important contributions to the development of society.

KEYWORDS: Ethics; Philosophy; Greece; Mosaic Law.

Delimitando os diálogos

Antes de adentrar especificamente no tema, convém alertar que escapa ao objetivo deste texto tecer considerações acerca dos projetos de salvação propostos pela filosofia grega, inclusive segundo o pensamento estoico, e pela óptica monoteísta desenvolvida no Monte Sinai.

Não é escopo desta análise verificar a existência de um Deus pessoal (ou impessoal, como no panteísmo grego) e de um Salvador, ou se é possível alcançar a salvação por meio da própria razão e da conformidade com a natureza das coisas.

Aqui serão avaliados os principais pontos dessas duas formas de pensamento, focados naqueles que sejam úteis em atividades diárias no plano horizontal, isto é, na relação entre semelhantes.

Desde logo convém esclarecer que por ética, que provém do grego ethos, entendem-se os valores, costumes, práti­cas e hábitos de uma pessoa ou coletividade que têm im­pactos positivos ou negativos na vida de seus semelhantes. Neste texto, a ética é considerada sinônimo de moral, apesar das opiniões em contrário.

A ética dos principais pensadores da Grécia Antiga

A presente análise será especialmente voltada para três principais pensadores: Sócrates, Platão e Aristóteles.

Embora tenham vivido no curto interregno temporal de apenas 147 anos (de 469 a.C. a 322 a.C.), esses autores romperam com uma visão de mundo baseada em mitos e transformaram a forma de pensar hegemônica, substituindo as crenças mitológicas pelo uso da razão como ferramenta questionadora, reflexiva, dedutiva e investigativa, influenciando nossas vidas até o presente momento.

Sócrates – viveu entre 469 e 399 a.C. e com ele é possível aprender sobre a importância de viver e, se preciso for, até mesmo morrer em conformidade com aquilo em que se acredita e que se prega; reconhecer a insuficiência dos próprios conhecimentos; analisar situações a partir de outras ópticas; ter consciência da perene necessidade de duvidar daquilo que recebemos como informação; e saber manter-se em constante busca pela verdade. 

Citado por Platão em suas obras, Sócrates indaga, em uma de suas provocações: “… não te sentes envergonhado por te preocupares com a aquisição de riquezas, reputação e hon­ras, enquanto não te importas nem te atentas para a sabedoria, a verdade e o aperfeiçoamento de tua alma?” (Apologia de Sócrates, p. 50). Esse questionamento é típico de Sócrates, que tinha por sacerdócio impelir seus semelhantes a uma autorreflexão acerca de suas crenças, atitudes e objetivos.

Platão –nasceu em 427 a.C. e faleceu em 348 a.C. Com ele, a humanidade é convidada a pensar além da realidade material, tentando, por meio da razão, acessar o que seria uma sociedade ideal, uma vida ideal, um casamento ideal, uma jus­tiça ideal, pois parte da premissa de que todos vivem en­tre sombras imperfeitas dos projetos ideais e atemporais que existem noutra dimensão (ideal), da qual se tem conhecimento antes mesmo de o indivíduo vir a este mundo.

Contudo, não é por meio da crença mitológica, e sim com o uso da racionalidade e da reflexão que se pode inquirir acerca daquilo que é ideal, perfeito e justo, e efetivamente alcançar esse conhecimento. A busca por esse obje­tivo tem como suporte as virtudes inatas da sabedoria, da coragem e do autodomínio, que dão condições de caminhar rumo à felicidade.

Aristóteles – viveu de 384 a 322 a.C. e completa esse trio de ilustres figuras que, com seus pensamentos, ainda hoje influenciam boa parte do mundo ocidental. Ele ensina que se deve atentar para a realidade material que circunda o sujeito – não para assuntos transcendentes – e dela tirar ensinamentos, conceitos e conclusões de como as coisas real­mente são, sistematizando o conhecimento a fim de re­correr a ele quando necessário.

Conforme Aristóteles, a felicidade é posta como condição a ser buscada pelos homens, a qual é possível conquistar ao se atingirem as virtudes moral e intelectual, alcançáveis por meio do hábito e do estudo (Ética a Nicômaco, p. 139). Aliás, o esforço próprio é fundamental, visto que não há uma forma predefinida do indivíduo, uma vez que as compreensões interiores são reflexos de informações absorvidas pelos sentidos.

Assim, com essas três fenomenais mentes da Grécia Antiga se aprendeu a: questionar os conhecimentos que são passados quase de forma automática; viver e até morrer em coerência com aquilo em que se acredita; utilizar a razão para estabelecer ideais de justiça; atentar-se à realidade que circunda o indivíduo e buscar a felicidade por meio da virtude adquirida com o hábito e o esforço, evitando tanto o vício do excesso como o da omissão.

É importante destacar o ensinamento de que um caráter vir­tuoso não é fruto de atos isolados, mas de uma vida habituada em praticar aquilo que é reto e justo, pois, nas palavras de Aristóteles, “… a virtude moral resulta do hábito…” (op. cit., p. 39).

Evidentemente isso é apenas um indicativo da ética desses três colossos da filosofia. Contudo, próximo dos gregos havia outro grupo, os hebreus, que viviam de acordo com um modelo social que também irradia seus efeitos até o presente dia.

Moisés, o Monte Sinai e sua importância na história do mundo ocidental

Aproximadamente 1.100 anos antes de os gregos iniciarem o período áureo de sua filosofia com o nascimento de Sócrates (469 a.C.), a cerca de 1.500 quilômetros da Grécia, em 1526 a.C., no Egito, nascia Moisés, que seria conhecido na posteridade como o grande legislador, libertador e profeta para nada menos que as três principais religiões monoteístas do mundo: o judaísmo, o cristianismo e o islamismo.

Após receber o chamado de Deus para libertar os hebreus do Egito, desafiando o poder do faraó, foi levado a peregrinar pelo deserto com milhares e, talvez, até milhões de pessoas. Como esse povo tinha vivido quatro séculos na condição de escravidão, era preciso estabelecer leis que regessem todos os aspectos de suas vidas.

Assim, conta a tradição judaico-cristã que Deus chamou Moisés ao Monte Sinai, onde lhe concedeu duas tábuas de pedra contendo os Dez Mandamentos. Segundo os judeus, Deus entregou não apenas esses ensinamentos sagrados, mas toda a Torá, que equivale aos cinco primeiros livros da Bíblia Cristã.

Na Torá estão inseridos todos os mandamentos que o povo de Deus deve guardar. O ilustre Maimônides, importante filósofo e grande autoridade em relação ao estudo da Lei Mosaica, sistematizou todos os Mandamentos Divinos, sendo 613 preceitos positivos (faça) e negativos (não faça) a serem observados. 

Após a entrega desses Mandamentos a Moisés, a história dos hebreus passou a ser marcada pelos profetas enviados por Deus para alertar o povo acerca da necessidade de obedecer aos Comandos Divinos. Depois de muitos altos e baixos, Deus enviou seu Filho, Jesus de Nazaré, para ser o Cristo, o Messias, aquele que tinha por missão libertar o povo, não mais das aflições terrenas, e sim das espirituais, da escravidão do pecado.

Contudo, o próprio Jesus afirmou que não tinha por mis­são acabar com os Mandamentos de Deus, ou seja, com a “Lei” (Mt 5:17-18, Lc 16:17, Rm 3:31 etc.), tampouco trazia novos mandamentos, mas uma nova interpretação segundo o coração do Pai, e não conforme a hipocrisia da religião da época (Mt 23:23-25), ampliando a aliança do Eterno com todos os povos (Is 42:1-4).

Mario Javier Saban corrobora esse entendimento: “… todaslas enseñanzas de Jesús son plenamente judías y que todas ellas se encuentran en la más noble tradición del pueblo de Israel” (El judaísmo de Jesús, p. 19).

Iniciou-se, assim, o cristianismo, que, após ser cruelmente perseguido, tornou-se a religião oficial do grande e poderoso Império Romano, dando condições para o estabelecimento da Igreja Católica Apostólica Romana – no mundo ocidental, pois no Oriente a Igreja Ortodoxa caminhou paralelamente após o grande cisma –, e teve significativa influência na constituição do mundo moderno, não apenas no aspecto geopolítico, como também nas legislações e na própria configuração das sociedades, o que só passou a ser minimizado paulatinamente após o nascimento da filosofia moderna e seu humanismo.

Apesar disso, em toda cultura ocidental, bem como em sua legislação, é possível ver raízes das matrizes principiológicas trazidas à luz ou, melhor dizendo, reveladas a Moisés no Monte Sinai, as quais, junto com as bases lançadas pela filosofia da Grécia Clássica, descritas brevemente acima, formataram o modo de pensar e viver ao longo da história do mundo ocidental.

CONTINUA…


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Sobre o Autor

H. S. Lima

H. S. Lima é escritor, advogado e palestrante. Tem como propósito de vida compreender os princípios eternos contidos principalmente nos cinco primeiros livros do Antigo Testamento, chamados de Pentateuco ou Torá, identificar a compatibilidade com a mensagem de Jesus Cristo, para então ensinar como observá-los na vida pessoal e profissional.

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